DIREITO COMPARADO – As sociedades simples e a busca pelo veto presidencial

Por Rodrigo Xavier Leonardo e Flávio Tartuce

Encontra-se à espera da sanção presidencial um projeto de lei que promete tornar o Brasil mais caro, ineficiente, intervencionista e inseguro para milhares de profissionais que trabalham, pagam impostos e geram empregos.

Como advogados e professores integrantes da Rede de Direito Civil Contemporâneo (RDCC) e do Instituto Brasileiro de Direito Contratual (IBDCONT), organizações sem fins econômicos que colaboraram com a elaboração e a revisão de diversos projetos legislativos, pretendemos apresentar fundamentos relevantes que justificam o veto de dispositivos do PL 15/21, originado da Medida Provisória nº 1.040/21, que, entre outras impropriedades, almeja qualificar todas as sociedades como empresárias, extinguindo as chamadas sociedades simples (não empresárias).

As sociedades simples tradicionalmente servem de suporte ao desenvolvimento de atividades por profissionais liberais (como, por exemplo, médicos, advogados, arquitetos, engenheiros etc.).

Se virar lei o PL 15/21, esse tipo societário será extinto, majorando ainda mais o “custo Brasil”: as atuais sociedades simples, transformadas em empresárias, repentinamente serão obrigadas a contratar consultorias, jurídicas e contábeis, para promover adaptações, entre as quais sublinha-se a adoção de um sistema de contabilidade empresarial, mais complexo e custoso.

O país também ficará mais ineficiente. Inesperadamente, sociedades com décadas de existência terão de deixar de concentrar esforços exclusivamente no bom desenvolvimento de suas atividades para dragá-los, permanentemente, para mudanças em suas relações com os registros públicos (do registro civil à Junta Comercial), com as suas assessorias contábeis e fiscais, com os seus clientes etc.

Sob a perspectiva tributária, por exemplo, algumas sociedades podem ser penalizadas pelo recrudescimento da carga tributária (como, v.g., o tributo ISS para as sociedades de advogados).

O PL 15/21 também destila um novo rompante intervencionista estatal nas relações entre particulares: quem quiser desenvolver uma atividade econômica por intermédio de uma sociedade necessariamente terá de ser empresário! Não há mais escolha!

Até agora no Brasil, e ao que se sabe em boa parte do mundo, ser empresário é uma escolha que envolve ônus e bônus.

O modelo das sociedades empresárias apresenta benefícios (como, por exemplo, a possibilidade de se utilizar da recuperação extrajudicial ou judicial) e custos organizacionais (tal como a escrituração contábil). O modelo da sociedade simples, em sinonímia, é mais descomplicado, porém, além de não poder lançar mão da recuperação, extrajudicial ou judicial, muitas vezes envolve a responsabilidade ilimitada dos sócios.

A mesma Presidência da República que em 2019 propôs uma Medida Provisória da Liberdade Econômica (MP 881/19) agora quer decretar o fim dessa liberdade de escolha dos modelos societários para o desenvolvimento de atividades lucrativas.

Em alguns setores, como na advocacia, até o presente momento é obrigatório que as sociedades adotem o tipo da sociedade simples com responsabilidade ilimitada dos advogados pelos eventuais danos praticados aos seus clientes. Doravante será possível aos advogados se organizarem em sociedades com responsabilidade limitada? Qual o tamanho da insegurança criada pela irrefletida mudança legislativa?

Como ficará a segurança jurídica para os inúmeros atos, contratos e atividades desenvolvidos com sociedades simples, sob o regime jurídico que é pertinente a esse tipo, diante de uma transformação do modelo jurídico societário imposto repentinamente pelo legislador. O Direito Privado exige estabilidade e previsibilidade para as relações, em sentido oposto ao que agora resta ameaçado pelo PL 15/21.

Toda essa repentina, pouco discutida e inesperada transformação tornará o país mais caro, ineficiente, intervencionista e inseguro.

Seria a culpa do estagiário? Só pode ser… Mas ainda há tempo para corrigir os rumos! O veto presidencial é a providência indispensável para se evitar mais um acréscimo de custo ao desenvolvimento de atividades econômicas no Brasil.

Fonte: Consultor Jurídico

Posts relacionados

Deixe um comentário