JUROS SOBRE JUROS – Falta de prova pericial em caso de contrato do SFH é cerceamento de defesa

Por Camila Mazzotto

Em caso de débito vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH), saber se o sistema de amortização implicou ou não cobrança de juros sobre juros é “matéria técnica que demanda a produção de prova nesse sentido”. Do contrário, ocorre cerceamento de defesa.

Esse entendimento foi adotado pelo desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJ-MT), para acolher preliminar de cerceamento de defesa pela falta de prova pericial em contrato vinculado ao SFH.

Assim, foi anulada a sentença de primeiro grau e determinada a produção da prova técnica.

O caso é de um contrato de compra e venda de imóvel pelo SFH firmado em setembro de 2016, no valor de R$ 170 mil. Os autores da preliminar recorreram à Justiça para pedir uma perícia contábil, alegando excesso nos juros, já que o capital emprestado virou uma dívida de cerca de R$ 751 mil.

Na primeira instância, o pedido foi negado. O juízo entendeu que não havia necessidade de prova técnica, pois considerou que o contrato não apresentava ilegalidades relacionadas a juros, correção e capitalização. Ao TJ-MT, os apelantes defenderam que a sentença deveria ser anulada por não ter sido dado o devido direito ao contraditório.

Cerceamento de defesa

Em sua decisão, o relator Rubens de Oliveira Santos Filho afirmou que negar a perícia técnica ao caso configura “cerceamento de defesa”. Isso acontece quando uma parte é impedida de produzir prova que compete a ela e, por isso, tem contra si uma decisão fundamentada justamente nessa falta de prova.

Para o desembargador, a perícia é necessária para identificar a veracidade das arguições dos apelantes sobre a possibilidade de cobrança indevida.

“Na ação revisional, em regra não se revela imprescindível a perícia contábil quando a matéria abordada nos autos for exclusivamente de direito, pois para o exame dos pedidos basta a mera leitura do contrato, salvo se o juiz entender o contrário — princípio do livre convencimento motivado”, explicou ele.

“Todavia, tratando-se de débito vinculado ao SFH — Sistema Financeiro de Habitação, saber se o sistema de amortização implicou ou não na cobrança de juros sobre juros é matéria técnica que demanda a produção de prova nesse sentido”.

O magistrado afirmou que o caso julgado, por se tratar de “excussão da garantia fiduciária vinculada à aquisição de imóvel com a finalidade de moradia das partes”, exige um maior cuidado no trâmite, a fim de garantir o pleno direito à ampla defesa.

Ele também explicou que a relação de consumo autoriza ao magistrado inverter o ônus probatório a favor do consumidor, para que o banco traga aos autos todo o procedimento de execução extrajudicial da garantia fiduciária e as notificações dos leilões. O objetivo da medida é apurar se a excussão do imóvel respeitou os termos da Lei 9.514/97.

Por isso, além de determinar a produção de prova pericial e acolher a preliminar de cerceamento de defesa, o desembargador determinou a juntada do procedimento de execução extrajudicial e as notificações dos leilões relacionados ao caso.

A parte apelante foi representada na ação pelo advogado Orlando Anzoategui Jr., da banca Anzoategui Advogados. Para ele, a importância da decisão do TJ-MT é “muito pontual”. 

“Muitas decisões têm decidido sem ao menos fazer a realização da perícia, que é crucial para mensurar e constatar a existência ou não de irregularidades e abusividades nos valores e encargos contratuais, sem a qual é impossível o juízo auferir se ocorreu ou não a ilegalidade”, comentou o advogado.

Fonte: Consultor Jurídico

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