OPINIÃO – Os desafios no mercado de loteamentos

Fatima Tadea Rombola Fonseca/Daniela de Pontes Andrade

Comercial

O mercado de loteamentos apresenta desafios significativos que demandam atuação estratégica e investimentos consideráveis.

Os esforços começam pela concepção do projeto, com a identificação da área e a realização de estudos de viabilidade técnica e ambiental, e continuam com a aquisição de grandes glebas — o que costuma envolver sua regularização e a superação de entraves documentais —, além de aprovações e da realização de obras de infraestrutura, sem considerar os custos envolvidos na comercialização dos lotes, que também representam um componente significativo do investimento.

Embora o crédito habitacional tenha aumentado, na prática, as linhas para financiamento de compra de lotes são muito limitadas. As instituições financeiras julgam que a liquidez dos lotes é menor e que é difícil fazer a análise de risco de crédito dos adquirentes, especialmente em empreendimentos mais populares.

Além disso, o descasamento de fluxos entre a realização das obras de infraestrutura (em quatro anos) e a liquidação dos recebíveis para esse tipo de ativo (entre 10 e 30 anos) dificultam o autofinanciamento à produção.

Diante desse cenário, o recurso ao mercado de capitais, por meio de estruturas de dívidas/crédito como o Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI), torna-se uma opção, embora envolva custos mais elevados e maior complexidade.

A associação com terceiros investidores (em geral, via estruturas societárias) também surge como alternativa, mas pode diminuir o controle do loteador sobre o empreendimento.

Reprodução

Em qualquer dessas soluções, o arcabouço contratual que regulará o financiamento poderá ser determinante para garantir ao loteador proteções necessárias em caso de adversidade.

A agilidade demandada pelo mercado de loteamentos tem motivado inovações por parte dos órgãos públicos, como as recentes mudanças no processo de licenciamento de loteamentos e condomínios de lotes na cidade de São Paulo (o Graprohab Digital e o Graprohab Integra).

No entanto, questões jurídicas de fundo ainda persistem e reafirmam a necessidade de um refinamento cada vez maior na análise e na auditoria do ativo imobiliário; tudo, enfim, para tentar antecipar exigências e outras dificuldades que afetam a viabilidade do empreendimento.

Impedimento no interior de SP

Em 2022, o município de Paulínia, no interior de São Paulo, foi impedido pela Justiça de licenciar novos loteamentos, condomínios e outros empreendimentos, pois o plano diretor, datado de 2006, não tinha sido revisado dentro do prazo previsto no Estatuto das Cidades, situação não mapeada, na maioria dos casos, pelos empreendedores.

Além disso, a transformação de glebas de terras em lotes urbanizados é sempre de interesse do município, pois transfere ao loteador a implantação de infraestruturas públicas que, muitas vezes, servem também à população local, além de desenvolver a atividade econômica de áreas ao entorno dos empreendimentos.

A razão menos óbvia — mas não menos relevante — é o aumento na arrecadação de imposto territorial e predial urbano, com a transformação da gleba (muitas vezes, rural) em lotes urbanizados e a construção de edificações nesses lotes.

No entanto, a avidez arrecadatória tem causado muitas discussões sobre o momento em que as situações acima ficam caracterizadas.

A situação mais comum era a cobrança do imposto territorial sobre lotes antes de sua efetiva existência, ou seja, antes da conclusão das obras de urbanização da gleba (os chamados lotes virtuais), fundamentada na Súmula 626 do STJ.

Pela súmula, a cobrança de IPTU sobre área urbanizável ou de expansão urbana não está condicionada à existência de, pelo menos, dois equipamentos públicos listados no artigo 32, § 1º, do Código Tributário Nacional.

Espera-se que essa prática seja deixada para trás com a recente inclusão do parágrafo 3º ao artigo 22 da Lei 6.766/79 (por meio da Lei 14.620/23). O parágrafo determina que os lotes somente serão inscritos no cadastro imobiliário após a emissão do Termo de Verificação e Execução de Obras (TVEO).

Como se não bastasse, e diante dos prazos elásticos para pagamento do preço dos lotes, a situação de crédito do adquirente pode oscilar, colocando em risco a capacidade de pagamento das parcelas do preço, afetando sua solvência.

O risco se estende à efetiva quitação das dívidas relacionadas aos lotes, principalmente IPTU e taxas associativas relativas à associação de moradores eventualmente constituída — cuja cobrança, não raras vezes, é objeto de questionamentos.

Em cenários críticos e, caso a estrutura contratual para realização das vendas dos lotes não tenha sido devidamente modelada, o loteador pode ainda se ver obrigado a administrar e arcar com essas dívidas para garantir os seus direitos e, inclusive, se proteger dos efeitos da negativação fiscal junto ao cadastro do município.

Os desafios em lotear não se esgotam aqui. Mas fica evidente a necessidade de aplicar inteligência jurídica em todas as etapas do desenvolvimento do loteamento.

Fonte: Consultor Jurídico

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