OPINIÃO – Possíveis impactos da reforma tributária sobre a herança

Por Caroline Pomjé e Júlia Costa Leivas

A proposta da reforma tributária aprovada pela Câmara dos Deputados e encaminhada ao Senado apresenta novidades impactantes em diversos setores, com alterações aplicáveis ao regime de transmissão sucessória de bens, caso a PEC 45/2019 seja aprovada em definitivo.

No Brasil, a transmissão dos bens após a morte do titular ocorre mediante o procedimento de inventário, que pode ser realizado de forma judicial ou extrajudicial. Em qualquer das hipóteses, uma das principais despesas relacionadas à finalização do procedimento corresponde ao pagamento do tributo incidente sobre a transmissão hereditária: o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação).

Trata-se de imposto de competência estadual, de modo que cada Estado da Federação possui regramento próprio, autorizado pelo artigo 155, inciso I, da Constituição.

Comparando o sistema tributário atual e o modelo a ser possivelmente instituído por meio da reforma tributária, três pontos merecem destaque quanto às questões sucessórias: a definição da competência territorial para a cobrança do ITCMD incidente sobre a transmissão causa mortis de bens móveis, títulos e créditos; a obrigatoriedade de que a alíquota desse imposto seja aplicada de maneira progressiva sobre a transmissão hereditária; e a regulação da transmissão de bens do falecido localizados no exterior.

O primeiro ponto de destaque decorre da possível alteração da competência territorial para cobrança do ITCMD sobre bens móveis, títulos e créditos. Isso porque, no sistema tributário atual, a referida competência para cobrança do imposto de herança é atribuída ao Estado “onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal”.

Tratando-se de bens móveis, títulos e créditos deixados pelo falecido, portanto, os herdeiros podem, no sistema atual, optar pela realização do inventário em Estado diverso daquele em que residia o de cujus. Desse modo, viabiliza-se, em algumas hipóteses, economia tributária em virtude da diferença de alíquota existente entre os estados do país. Falecida uma pessoa na Bahia, por exemplo, em que as alíquotas de ITCMD para a sucessão variam entre 4% e 8%, e tendo deixado bens móveis (como quotas de uma empresa), pode-se cogitar, no sistema atual, da realização do seu inventário em outro estado, como São Paulo, em que a alíquota é fixa em 4%. 

Conforme a PEC 45/2019, no entanto, tal possibilidade será vedada. De acordo com o texto aprovado pela Câmara dos Deputados, o artigo 155, §1º, inciso II, da Constituição, passará a prever que a competência para tributação sobre os bens móveis, títulos e créditos deixados pelo falecido será exclusivamente do “Estado onde era domiciliado o de cujus, (…), ou a Distrito Federal”.

A segunda alteração significativa, relativamente à matéria sucessória, refere-se à obrigatoriedade da instituição de alíquotas progressivas sobre a transmissão hereditária — o que significa que, quanto maior for o patrimônio herdado individualmente, maior será a alíquota do ITCMD. Atualmente, a progressividade é uma faculdade conferida aos estados, havendo unicamente a previsão de que as alíquotas máximas serão fixadas pelo Senado (sendo que o teto atual do ITCMD é de 8%).

Com a possível inclusão do inciso VI ao §1º do artigo 155 da Constituição, no entanto, tem-se a imposição de progressividade das alíquotas em razão do valor da transmissão patrimonial. Trata-se de mudança que, se aprovada, produzirá impactos significativos, especialmente nos estados que atualmente possuem alíquota fixa de ITCMD — como é o caso dos estados de Minas Gerais (5%), São Paulo (4%), Paraná (4%), Espírito Santo (4%) e Roraima (4%). 

Por fim, a terceira modificação diz respeito à tributação de bens do falecido situados no exterior. Atualmente, a Constituição Federal estabelece a necessidade de que lei complementar regulamente a incidência do ITCMD, “se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve seu inventário processado no exterior”.

Diante da ausência de lei complementar tratando sobre o tema, o entendimento do Supremo Tribunal Federal, proferido no Recurso Extraordinário 851.108/SP, foi no sentido da impossibilidade de cobrança do ITCMD pelos estados da Federação. Com a aprovação da proposta de reforma tributária na atual redação, contudo, haveria regra de competência provisória para cobrança do ITCMD incidente sobre os bens do de cujus, ainda que situados no exterior, até a superveniência de lei complementar regulando o artigo 155, §1º, III, da Constituição.

Nesse contexto, a competência para tal cobrança caberia “ao Estado onde o falecido era domiciliado, ou, se domiciliado ou residente no exterior, onde tiver domicílio o herdeiro ou legatório, ou ao Distrito Federal”.

Mudanças significativas na esfera sucessória, portanto, podem sobrevir com a aprovação da reforma tributária, evidenciando a relevância do tema e a necessidade de que, cada vez mais, questões relacionadas ao planejamento sucessório sejam pensadas pelas famílias brasileiras.

Fonte: Consultor Jurídico

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