OPINIÃO – Redução do ICMS deve criar fundos setoriais

Por Eduardo Diamantino

A retrospectiva de tributação do agro neste ano merece mais que um artigo. Foi tanta diversidade que daria uma novela. Vale mencionar alguns episódios: uma improvável redução do imposto sobre circulação de mercadorias no combustível e energia, a alteração de entendimento no Supremo Tribunal Federal, no caso do Funrural, que mudou de entendimento e retirou a validade da sub-rogação deixando o produtor como responsável pela exação; e a tentativa de criação de mais alguns fundos de tributação do agro. A isso acrescenta-se a ansiedade pela mudança do governo federal.

Um dos fenômenos mais importantes nesse ano que se finda é a resposta a redução do ICMS sobre os combustíveis e energia. Em alguns Estados como Minas Gerais, a alíquota caiu de 31% (gasolina) e 27% (energia), ambas para 18%. Óbvio que a perda de arrecadação decorrente da Lei Complementar 194/2022, nos cofres públicos, deveria (no mínimo) ser compensada com a criação de alguma outra exação. Imaginar que essa diminuição de carga tributária seria definitiva é pensar de forma inocente. Assim, para suprir essa perda existe uma tendência a criação de fundos de desenvolvimento setorial, que se alega não serem tributários, de duvidosa legalidade. Como o Agro vive um momento de sucesso, não há muita dúvida de que foi ele o escolhido para abastecer os cofres públicos.

O início do movimento dos fundos que tributam o Agro teve seu início com o Fundersul no Estado do Mato Grosso do Sul em 1999. Com certeza foi ele a fonte de inspiração do Fethab (Fundo Estadual de Transportes e Habitação) de Mato Grosso nos anos 2000.

A ideia inicial desses fundos era arrecadar recursos a serem empregados com infraestrutura que beneficiaria diretamente os contribuintes como, por exemplo, melhoria das estradas. Tem também uma suposta “não obrigatoriedade” em sua incidência. Ou seja, seriam facultativos. Vale registrar que por serem fundos/contribuições ou algo nessa linha, não entram no bolo de divisão com Municípios, isto é, burlam o artigo 159, inciso IV, da Constituição e o produto de sua arrecadação fica só com os estados.

O ponto central da discussão é a sua não obrigatoriedade (que é falsa) que retiraria o seu caráter tributário.

Esse é o ponto a ser revisitado. Para complicar ainda mais a questão, existem alguns precedentes em sentido contrário no STF. No caso do Fundersul, podemos citar o RE 602.492, 606.218 e 613.468. Existe também uma ADI 2056 onde o STF decidiu que: “A contribuição criada pela lei estadual não possui natureza tributária, pois está despida do elemento essencial da compulsoriedade. Assim, não se submete aos limites constitucionais ao poder de tributar”.

Essa não obrigatoriedade é falsa. Vejamos o exemplo de Mato Grosso. Dispõe a lei 7.263 e respectivas alterações e seu respectivo decreto que só se pode beneficiar de alguns instrumentos legais, como o diferimento, e o recolhimento mensal do ICMS quem for contribuinte do Fiagro. Mas será viável se produzir grãos sem o instituto do diferimento? Atende ao princípio da praticidade e da segurança jurídica recolhimento carga a carga do Imposto devido? Claro que não.

Em se tratando de Fethab também há um precedente ruim do STF, na ADI 6.314, onde a Corte Constitucional entendeu que a Autora não possuía título de entidade de classe, sendo considerada ilegítima para propor a ação. Com isso, deixou se de enfrentar a questão sobre o prisma correto.

Não temos dúvidas do seu caráter tributário e ousamos dizer que se trata de uma contribuição que não é de melhoria. Entendemos que se trata de contribuição no domínio econômico de competência exclusiva da União por força do artigo 149, inciso i da Constituição.

Enquanto isso, proliferam os fundos. Dentre eles, vale citar o Fundo Estadual de Desenvolvimento e de Infraestrutura do Estado do Maranhão, que tem incidência sobre o percentual no valor da tonelada dos produtos agrícolas. Muito semelhante ao Fethab.

No mesmo caminho, o Fundo de Desenvolvimento da Infraestrutura, também conhecido como FDI-PR (Projeto de Lei 498/22), do estado do Paraná, e o Fundeinfra (projeto de lei 10.804/22), ou Fundo de Infraestrutura do Estado de Goiás. Particularidades à parte, a ideia central é a mesma.

Obviamente que o setor agro reagiu duramente a essas figuras tributárias.  Na Assembleia Goiana, o texto foi aprovado, mas gerou grande polêmica e insatisfação dos produtores da região. Ainda pende a sanção do governador Ronaldo Caiado. Já no Legislativo paranaense, ante a enorme repercussão, optou-se pela retirada da criação do Fundo do “pacotaço” legislativo.

Devemos lembrar que a ameaça está posta. Custa acreditar que desistirão dessa tributação. Ao que parece, a qualquer momento, outras tentativas serão feitas. Estamos diante de uma tentativa de substituir a redução do ICMS dos combustíveis e energia de toda a sociedade por uma contribuição que incide sobre a produção agrícola. Precisamos conseguir uma forma de sensibilizar os julgadores e extirpar esse tributo da vida dos agricultores.

Fonte: Consultor Jurídico

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