OPINIÃO – Desafios e perspectivas da lei complementar nas obrigações tributárias

Verônica Gomes da Silva

A complexidade do sistema tributário brasileiro sempre foi um desafio para empresas que, além de lidarem com a carga tributária elevada, enfrentam uma teia de obrigações acessórias que aumentam os custos operacionais e dificultam a gestão. Nesse cenário, a Lei Complementar (LC) nº 199/23 surge como um marco significativo na recente reforma tributária nacional, com a promessa de descomplicar as obrigações tributárias acessórias em âmbito federal, estadual e municipal, buscando reduzir a burocracia e estabelecer procedimentos uniformizados.

O Estatuto Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias, delineado pela LC, vai além da simples redução de custos operacionais. Ele ambiciona transformar o ambiente de negócios, removendo obstáculos que historicamente afastaram investidores estrangeiros. A proposta visa criar não apenas eficiência, mas também atratividade para o mercado internacional, contribuindo para o desenvolvimento econômico do país.

Embora a promoção da conformidade tributária seja mencionada como um dos objetivos centrais da LC nº 199, é essencial reconhecer que programas similares já estão em vigor desde 2018, alinhando-se às práticas globais.

Contudo, vetos questionáveis lançam sombras sobre a essência da simplificação proposta, alegando riscos à quebra de sigilo pela participação de entidades privadas. Vale ressaltar que a discussão sobre normas tributárias deve ser distinta do sigilo tributário do contribuinte, sendo uma temática de interesse público.

As disposições finais, voltadas para automatizar a escrituração fiscal entre entes tributantes, suscitam dúvidas sobre sua necessidade, especialmente em um cenário já ocupado pelo Sistema Público de Escrituração Digital (Sped).

O inciso IV do artigo 1°, ao mencionar “declarações pré-preenchidas e respectivas guias de recolhimento de tributos pelas administrações tributárias”, levanta a questão sobre a possível restrição do direito do contribuinte de aplicar sua interpretação em matéria tributária.

A decisão do Congresso de aprovar a LC nº 199 antes da reforma tributária, excluindo obrigações acessórias relacionadas ao Imposto de Renda (IR), levanta indagações sobre a verdadeira intenção por trás dessa escolha. A construção aparentemente unilateral da LC sugere um desinteresse genuíno nas necessidades dos contribuintes, agravado pela ausência de participação de entidades da sociedade civil, vetada na legislação.

Ao aprofundarmos nossa análise sobre a LC 199/23 e suas implicações na complexa paisagem tributária brasileira, é crucial examinar algumas lacunas e desafios que se apresentam.

A criação da Nota Fiscal Brasil Eletrônica e do Registro Cadastral Unificado, vetada pela legislação, poderia ter representado avanços significativos na unificação e simplificação das bases de dados. Esses vetos levantam questões sobre a amplitude real da simplificação proposta pela LC 199 e destacam a necessidade de futuras revisões e ajustes legislativos para alcançar uma modernização efetiva do sistema tributário.

Embora a LC tenha estabelecido o Comitê Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias (Consoa) como um mecanismo para gerir as mudanças, a efetividade desse órgão na supervisão e gestão dessas alterações permanece uma incógnita. Será fundamental observar como as empresas se adaptarão a essas mudanças e como o Consoa atuará na condução de um ambiente tributário mais simplificado.

Em resumo, a LC 199 marca um avanço na busca por um sistema tributário mais eficiente e amigável para as empresas. No entanto, os vetos a determinados dispositivos revelam que o caminho para a simplificação total ainda é desafiador. É crucial que o governo continue a monitorar e ajustar a legislação, garantindo que as empresas brasileiras colham os benefícios almejados por essa reforma tributária.

A construção de um ambiente tributário mais favorável requer não apenas legislações robustas, mas também um comprometimento constante com o aprimoramento e a adaptação. Somente através desse compromisso poderemos alcançar uma real transformação nas obrigações tributárias acessórias, beneficiando não apenas as empresas, mas também promovendo um ambiente de negócios mais competitivo e atraente para investimentos.

Fonte: Consultor Jurídico

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