OPINIÃO – Desmistificando a cláusula de exclusão de responsabilidades

Por Juliana Sydow e Maria Luisa do Amaral

Quem lida com contratos em suas atividades profissionais, com frequência se vê diante de cláusulas que visam restringir a responsabilidade de uma parte ou ambas quanto a determinados tipos de danos que possam decorrer da contratação, mas cuja redação acaba por utilizar termos e expressões incompreensíveis ou com os quais não estamos familiarizados diante da nossa legislação.

É comum que referidos termos e expressões contidos nessas cláusulas causem preocupações e inseguranças, pelo que nosso objetivo com este artigo é discorrer de forma bastante simples e objetiva sobre os termos mais habitualmente utilizados em cláusulas desta natureza, de exclusão de responsabilidade, visando, se não dirimir, ao menos acalmar os ânimos daqueles que repetidamente se afligem ao tratar do assunto.

De acordo com o artigo 389 do nosso Código Civil, não cumprida a obrigação, fica o devedor obrigado a indenizar a outra parte pelas perdas e danos causados, o que pode incluir “danos materiais” e/ou “danos morais”. Cabe lembrar que, de acordo com a Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça, a pessoa jurídica pode também sofrer dano moral.

Dentro do primeiro conceito abordado, de “danos materiais”, podemos identificar duas subcategorias de danos, considerando o quanto estabelece o artigo 402 do Código Civil, no sentido de que o credor tem direito de receber indenização tanto a) pelo que efetivamente perdeu, quanto b) pelo que deixou de ganhar.

Para facilitar, em linha com nossa doutrina e jurisprudência, podemos identificar o item a) (o que efetivamente perdeu) como “danos emergentes” (ou “danos efetivos”; mas vamos preferir o outro termo neste artigo), e o item b) (o que deixou de ganhar), como “lucros cessantes”.

Outro conceito importante, e bastante corriqueiro nas cláusulas aqui em comento, correspondente ao “dano direto”, podemos extrair do artigo 403 do Código Civil, berço da teoria da causalidade direta, traduzindo-se pelo dano que surge como consequência direta e imediata do descumprimento contratual.

E, em contrassenso, temos também o conceito de “dano indireto”, como aquele que não se verifica como uma consequência direta e imediata da conduta do devedor, mas trata-se, na verdade, de uma consequência posterior, advinda do próprio dano direto: uma parte sofre um dano principal e, em consequência deste, ainda suporta outro.

Segundo a aludida teoria da causalidade direta, a responsabilidade civil (contratual) exige não só a culpa da parte no cumprimento da obrigação, mas também que essa culpa seja a causa direta e imediata do dano material. Portanto, em linha com este raciocínio, só se indenizará os prejuízos, sejam estes danos emergentes ou mesmo lucros cessantes, que surjam como efeito direto e imediato da conduta infratora, podendo-se concluir que o conceito de dano indireto não é considerado como dano indenizável ao abrigo do referido artigo.

Cumpre esclarecer que a legislação pátria e o Código Civil, particularmente, não disponibilizam outras hipóteses ou subcategorias que possam se enquadrar como exemplos dos conceitos de “danos emergentes” e “lucros cessantes”. Ou seja, não há na lei brasileira outras definições de danos além destas, como, por exemplo, “dano consequencial”, “dano punitivo”, “dano incidental”, dentre outras. Essas e outras expressões semelhantes são encontradas em contratos regidos por leis de países que baseiam seu sistema jurídico na common law, não havendo tradução idêntica ou pacífica no sistema da civil law adotado em nosso país.

Ademais, nossa legislação também não separa os tipos de danos nela abordados explicitamente (“danos emergentes”, “lucros cessantes” e “danos morais”), em “danos diretos” ou “danos indiretos”. A conclusão a respeito da classificação do dano como “direto” ou “indireto” dependerá de uma avaliação, caso a caso, dos elementos do mencionado artigo 403, a saber: 1) culpa, 2) nexo de causalidade direta e imediata e 3) efetividade do prejuízo.

Em regra, sendo o contrato celebrado entre agentes plenamente capazes, cujo objeto seja lícito, possível, determinado ou determinável, e sua forma prescrita ou não proibida por lei (artigo 104 do Código Civil), prevalecerá a liberdade entre as partes e a plena validade da cláusula de exclusão de responsabilidades. Por outro lado, nada adianta que as Partes escrevam aleatoriamente, na redação da cláusula, todas as possíveis e imagináveis expressões acerca dos tipos de danos. Havendo a intenção de se delimitar de forma mais aprofundada a responsabilidade das partes, a recomendação é que se prevejam os significados para cada tipo de dano que for incluído na redação da cláusula, evitando-se discussões posteriores sobre a intenção que se buscava com a cláusula.

Por fim, sobre a exclusão da responsabilidade por danos indiretos, seja como for, e em que pese a teoria da causalidade direta, já explicada acima, não os considerar como indenizáveis, é muito comum ver a menção a esse tipo de dano na cláusula de exclusão de responsabilidade em contratos firmados no Brasil. Portanto, em prol da minimização das possíveis divergências entre as partes e o máximo alinhamento das expectativas entre elas, poderia ser considerada a alternativa de manter tal exclusão de danos indiretos.

Fonte: Consultor Jurídico

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