OPINIÃO – Tributação da pessoa física controladora de offshore na MP 1.171

Por Pedro Tavoni Céglio

Publicada no último dia 30 de abril, a Medida Provisória 1.171 institui a mais recente alteração do Imposto de Renda das Pessoas Físicas e promete protagonismo nas pautas de discussões tributárias dos próximos meses. Referida MP trata da tributação da renda auferida pelos contribuintes pessoas físicas proveniente de entidades controladas no exterior (offshores).

De acordo com a norma, a partir de 1º de janeiro de 2024, tais rendimentos serão apurados de forma apartada na Declaração de Ajuste Anual da Pessoa Física residente no Brasil. A medida provisória isenta a tributação dos investimentos até R$ 6 mil, ao passo que a parcela que ultrapassar essa meta e que seja inferior a R$ 50 mil, sofrerá incidência de alíquota de 15%. Já o valor que exceder R$ 50 mil deve ser tributado em 22,5%.

Além disso, o ato normativo prevê que a pessoa física será considerada sua controladora quando ela obtiver “direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores ou mais de 50% de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros, ou ao recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação”.

Tal rubrica, assinala a Medida, aplica-se não apenas isoladamente ao contribuinte, mas também quando, em conjunto com pessoas vinculadas, ele ostente esse grau de poder sobre a entidade. Por pessoas vinculadas, entende-se o companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, até o terceiro grau; as pessoas jurídicas que possuam tais partes em sua administração ou quadro societário; a pessoa jurídica de que o contribuinte seja titular e seus sócios.

Essa regulamentação, porém, tem destino a controladas que estejam situadas em paraísos fiscais (países com tributação favorecida nos termos da lei), ou caso a entidade possua renda ativa própria inferior a 80% do faturamento — sendo essa renda aquela proveniente de exploração de “atividade econômica própria, excluindo, por exemplo, os royalties, juros, dividendos, participações societárias, aluguéis, aplicações financeiras, intermediação financeira e ganhos de capital, exceto na alienação de participações societárias ou ativos de caráter permanente adquiridos há mais de dois anos”.

Tais critérios de incidência das regras já suscita debates. Especificamente em relação ao primeiro deles, apesar de se poder criticar o tratamento genérico dado ao investimento estabelecido nos países com tributação favorecida (independentemente da efetiva alíquota que se pratica no país no caso concreto), a MP parece ser coerente com o tratamento legislativo dado às operações que envolvem essas jurisdições, que também as trata genericamente quando as submete às regras de preço de transferência (artigo 24, Lei 9.430).

No que toca a estipulação do critério da “renda ativa própria”, igualmente se vê um tratamento coerente com o ordenamento jurídico nacional, na medida em que o artigo 21 da Instrução Normativa FRB 1.520/2014 já trazia a noção de “renda ativa”, a qual é utilizada como critério para fixação de regras na tributação de pessoas jurídicas estabelecidas no Brasil por rendimentos havidos por suas controladas no exterior.

Um ponto fulcral é alteração de método de apuração. A MP pretende criar uma regra impeditiva do diferimento tributário, e isso ocorre na medida em que a nova regulamentação transmuta seu regime contábil para o de “competência”. Ou seja, se antes os rendimentos das controladas no exterior somente autorizavam que as pessoas físicas controladoras fossem tributadas quando da efetiva distribuição do lucro (“regime de caixa”), a regra passará a ser a tributação no momento de sua apuração, ainda que não se tenha deliberado sobre a distribuição.

Essa modificação faz cair por terra um dos benefícios da constituição de entidades controladas em outros países (offshore), justamente o diferimento do tributo. Referida “postergação” do pagamento significaria, de acordo com a exposição de motivos da MP, tratar o controlador residente no Brasil — cuja controlada pode passar anos auferindo rendimento sem distribuir lucros (tributáveis aos cofres públicos brasileiros) — da mesma forma do contribuinte que tem investimentos financeiros no país, criando-se uma vantagem na remessa de valores ao exterior (invertendo-se a lógica alocativa).

Em suma, a MP editada induz alteração legislativa que certamente impactará os contribuintes brasileiros do IRPF, cujas regras, que nos parecem ser em grande medida consonante com Ordenamento pátrio, devem ser cuidadosamente analisadas na formalização do planejamento patrimonial e sucessório.

Por fim, ressalta-se que, apesar de a eficácia da MP ter início apenas em 1º de janeiro de 2024, ela ainda precisará passar pelo crivo do Congresso, em até 120 dias da publicação, oportunidade em que se poderá modificar o seu conteúdo e transformá-la em lei, se aprovada (artigo 62 da Constituição).

Fonte: Consultor Jurídico

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