OPINIÃO – Impactos da reforma tributária e os novos tributos aplicados ao agronegócio

Por Renan Fabro Monteiro e Marcus Reis

Desde 2019 tramitam no Congresso Nacional propostas de emenda à constituição (PECs) que têm o objetivo de realizar mudanças e/ou reformas no sistema tributário nacional, a famosa reforma tributária, a qual, entre as várias mudanças, trata da criação de novas figuras tributárias, mormente Imposto Sobre Bens (IBS) e Serviços e Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), conforme texto das PECs nº 128 e 110.

Essas novas espécies tributárias causam profundo impacto em todos os ramos da economia nacional e no agronegócio não seria diferente. Entretanto, um ponto específico merece a atenção para os profissionais da área, a tributação dos produtos semielaborados ou primários pelo IBS e pela CBS.

Pelo texto atual de ambas as PECs, tanto os produtos semielaborados como os primários passariam a ser tributados pelas novas figuras (CBS e IBS), o que atingiria de forma significativa os pequenos e médios produtores, parcela do mercado que não possui grande suporte técnico em questões tributárias, ao contrário dos produtores de grande porte.

Além do impacto econômico, temos que as novas formas tributárias ainda vão na contramão de um caráter principiológico adotado por nossa Constituição em relação aos produtos semielaborados e primários, qual seja, a neutralidade fiscal.

Um dos fatores primordiais que justificam a neutralidade fiscal desses produtos é de que estes são produzidos por produtores rurais que em quase a sua totalidade (98%, conforme a CNA) são pessoas físicas e não são contribuintes de ICMS, IPI, ISS, PIS e Cofins (consequentemente, não podem ser contribuintes de CBS ou IBS).

Tais produtores também não reúnem condições técnicas de terem uma escrituração contábil de controle das obrigações fiscais, o que é imposto pela legislação para desempenho de suas atividades. Logo, esses produtores não são tributados de forma pesada pois, caso assim seja feito, a produção em si será comprometida.

Aliado a isso, grande parte destes produtos primários e semielaborados do agronegócio brasileiro são exportados in natura, logo a tributação da base de consumo não é realizada por uma simples condição lógica, o produtor não se insere no conceito de destinatário final, logo não é consumidor, conforme preceito do CDC.

Além desse ponto, temos que a exportação de commodities tem seu preço regulado pelo mercado de bolsa, não havendo margem para novas tributações, em especial da CBS, do IBS ou quaisquer outros tributos.

Para corroborar esse entendimento, vemos que o Estado, no exercício de seu poder fiscalizador, não fiscaliza produtores rurais como pessoas naturais, tendo como foco maior de fiscalização as empresas adquirentes dos produtos.

O foco maior do Estado em questão tributária também é dirigido aos tributos incidentes sobre renda e patrimônio, e não a base de consumo. Esses, resumidamente, são os principais fatores para a Constituição adotar postura de neutralidade fiscal em relação a esses produtos e, consequentemente, aos produtores.

As PECs nºs 110 e 128, objetivando a inserção de novas figuras tributárias, em sua atual redação, vão na contramão dessa neutralidade fiscal. Tal situação motivou diversos fóruns de discussão dentro do agronegócio a respeito do tema e a respectiva discussão ainda não foi encerrada pelo Poder Legislativo.

Entre os diversos debates realizados, a conclusão apresentada, além do impacto econômico aos produtores e violação da principiologia de neutralidade fiscal, é de que a medida para o agronegócio em relação aos produtos semielaborados e primários revela-se uma grande contradição, sendo inclusive prejudicial, seja para o mercado seja para os cofres públicos.

A incidência de CBS ou IBS sobre os produtos primários e semielaborados implicaria uma obrigação tributária de alto custo para os produtores, criando, então, a necessidade das cooperativas agropecuárias/empresas mercantis, exportadoras ou não, financiarem o tributo para o governo, visto que receberiam e/ou adquiririam os produtos primários e semielaborados com o acréscimo da nova tributação.

Assim, essas empresas ficariam com um crédito fiscal a ser compensado no mercado interno, o que refletiria diretamente nos preços dos alimentos para a população brasileira, sendo que esse crédito nem sempre será repassado, tornando-se, então, crédito sem liquidez sujeito a impairment, ou seja, em termos práticos e financeiros se tornaria mais um custo público.

Tornando-se custo público, haveria, portanto, aumento estrondoso de passivo tributário governamental sobre as exportações, devendo tal custo ser devolvido aos contribuintes, situação inviável ao governo, eis que os valores a serem restituídos são corrigidos pela taxa Selic.

Em termos numéricos, o agronegócio brasileiro exporta mais de US$ 100 bilhões, admitindo-se qualquer tipo de alíquota nessa nova tributação (7% é a ideia inicial, ou alíquotas mais pesadas), temos que o Fisco teria um custo de devolução de tributos de R$ 40 bilhões, fora os valores decorrentes da atualização via Selic.

Com esta análise, entende-se que a tributação dos produtos primários e semielaborados pela CBS e pelo IBS no agronegócio revela-se como uma grande incongruência ou, até mesmo, um erro administrativo governamental, pois criará uma nova forma de cobrança para posterior devolução do valor com atualização pela taxa Selic, sendo que caso assim ocorra resultará em grande colapso nos gastos públicos, já que com o passar do tempo a devolução será maior do que a arrecadação.

Vale lembrar que na Constituição da República já existe previsão de proteção tributária do produto primário e semielaborado (artigo 91 c/c artigo 155, §2º, X, “a”), justificando sua melhoria para não prejudicar a economia do país, devido ao fato de o agronegócio ser o responsável pela geração de superávit primário, base sustentável de geração de milhares de empregos e distribuição social de renda.

Fonte: Consultor Jurídico

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