OPINIÃO – Reflexões trabalhistas em tempos de epidemia do coronavírus

Por Viviane de Azevedo Rodrigues

Recentemente, uma reportagem jornalística abordou um inesperado efeito-colateral da epidemia do coronavírus: a necessidade de isolamento e o receio de contágio provocará a maior experiência de trabalho remoto da história. Afinal, fora do epicentro do surto do vírus, outras províncias chinesas tentam manter suas rotinas, sem incrementar um grave problema de saúde pública.

Não é de se estranhar que as empresas chinesas se esforcem para se manterem operacionais, ainda que apenas em ambiente virtual, considerando o enorme impacto que uma epidemia dessa escala pode trazer ao país. Tecnologia e infraestrutura, afinal, não são grandes desafios para a China.

Mas é inevitável refletir sobre o assunto: e se fosse no Brasil, os locais não afetados primariamente poderiam continuar a trabalhar? Ao menos em termos de legislação do trabalho, pode-se dizer que o país está preparado.

No Brasil, já é prática comum a realização de home office pelas empresas mais modernas e por aquelas que têm restrição de espaço físico (trabalho em coworking não parece boa opção quando há surtos virais, como o de sarampo, que atingiu o Brasil em 2019). Nesse modelo, é facultado ao empregado prestar serviços em sua residência ou de outro local, em um ou alguns dias da semana.

home office não precisa estar expresso no contrato de trabalho, podendo ser previsto apenas em políticas corporativas, por exemplo. É comum que a empresa conceda um computador e um modem para conexão à internet ao empregado, mas além disso, não há muito mais dispêndio por parte do empregador. O empregado pode trabalhar na mesa que estiver disponível em casa, ou num momento de preguiça, até da própria cama.

Mas para além do trabalho remoto em caráter excepcional, desde a Reforma Trabalhista, nossa legislação prevê o teletrabalho, modalidade de labor exercido preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação.

Por ser uma modalidade específica de trabalho, é preciso aditar expressamente o contrato de trabalho dos empregados, além de especificar no documento outras questões, tais como as atividades que serão realizadas pelo empregado e quem será responsável pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos/infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto.

E faz sentido pensar em aditar contratos em caso de epidemia? O teletrabalho não está sujeito a controle de jornada de trabalho, enquanto o trabalho em sistema home office continua sujeito a tal controle. É de se pensar.

Mas como não é possível só pensar produzir em cenários de catástrofe, a Lei 13.979/2020, publicada em 7 de fevereiro e que dispõe sobre as medidas de emergência a serem tomadas em função do surto do coronavírus, estabelece que podem ser adotadas, dentre outras, medidas de isolamento, quarentena e restrição excepcional e temporária de entrada e saída do Brasil, sendo considerada falta justificada à atividade laboral o período de ausência do trabalhador que decorra das medidas previstas na lei.

As relações de trabalho brasileiras podem, portanto, acomodar uma situação como a que vive a China (ou simplesmente lidar com os episódios de chuvas e alagamentos tão comuns nas capitais brasileiras). A questão central é, provavelmente, de infraestrutura. Talvez o cenário mude após o advento da tecnologia 5G.

Fonte: Consultor Jurídico

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